Não é novidade que a tecnologia, ao longo dos anos, proporcionou relevantes – e, até então, aparentemente impossíveis – conquistas.
Se, antes, era impensável que simples dispositivos eletrônicos (computadores, tablets, celulares, etc) seriam capazes de realizar os mesmos serviços que são prestados em agências de instituições financeiras e bancárias, hoje essa já é a realidade.
Mais que isso: as últimas pesquisas divulgadas no Congresso e Exposição de Tecnologia da Informação das Instituições Financeiras (CIAB-FEBRABAN), de 2021, já indicam que as transações realizadas pelo Mobile Banking atingiram a marca histórica de 51% do total das operações bancárias feitas no País , o que torna evidente a sua relevância para o setor econômico.
Contudo, embora sejam inegáveis as facilidades que proporcionam e, conforme será melhor analisado, seja intensivo o tratamento que o ordenamento confere aos contratos virtuais, isso não afasta a possibilidade de ocorrer fraude em determinadas operações. Infelizmente, não são raras as ligações feitas por terceiros, que se identificam como funcionários de alguma instituição financeira e, após apresentarem dados do próprio consumidor (tais como CPF, endereço, número de agência, conta ou, até mesmo, cartão de crédito), conseguem ter acesso a informações ainda mais sigilosas, tais como senhas e códigos de segurança e, a partir disso, fazem diversas transações, em especial, contratação de
empréstimos e transferências de valores.
Embora seja clara a ocorrência de crime de estelionato nessas hipóteses (art. 171 do Código Penal), os desdobramentos civis dessas operações são controversos, pois, embora de um lado esteja o consumidor, vítima de ilícito penal, do outro está a instituição financeira, que as autorizou porque foram realizadas com senhas pessoais e, via de regra, intransferíveis.
Com isso, são comuns as dúvidas e incertezas quanto à validade dos contratos e das operações realizadas via Mobile Banking, além de tornar duvidoso o tratamento que deve ser dado a situações excepcionalíssimas, tais como golpes e fraudes praticadas nas plataformas virtuais.
O ordenamento jurídico – que tem conceito amplo, consistindo sobretudo no conjunto de normas legislativas, executivas e judiciais – trata do assunto de forma difusa, com leis que regulamentam os contratos virtuais e, ao mesmo tempo, buscam proteger direitos fundamentais das partes contratantes, dentre as quais mais se destacam os Códigos Civil e de Defesa do Consumidor, além da recente Lei Geral de Proteção de Dados.
Não é novidade que o Código de Defesa do Consumidor (de 1990) e o Código Civil (2002) foram redigidos sob outra (e mais antiga) ótica social, quando os contratos de Internet e Mobile Banking ainda não eram amplamente utilizados. Contudo, isso não quer dizer que suas disposições simplesmente não se aplicam.
Inicialmente, é preciso ter em mente que o Mobile Banking não é uma nova espécie de contrato, mas apenas um novo meio ou canal de negociação. Portanto, está sujeito aos mesmos pressupostos contratuais (capacidade das partes, licitude do objeto e legitimidade), consolidando-se apenas quando houver manifestação de vontade de ambos os contratantes, que devem, sempre, observar os deveres de probidade e boa-fé.
Ainda, também devem ser observados os pressupostos de uma relação consumerista, assim determinado pela Resolução no 4.283/2013 do Banco Central do Brasil, que, em conformidade com o art. 6o, III, do CDC (que versa sobre o direito básico de informação do consumidor), estabelece o dever de “prestação das informações necessárias à livre escolha e à tomada de decisões por parte de clientes e usuários, explicitando, inclusive, direitos e deveres, responsabilidades, custos ou ônus, penalidades e eventuais riscos existentes na execução de operações e na prestação de serviços”.
Sendo assim, em um primeiro momento, caso seja atendido o que a legislação exige, não há empecilho para a existência e validade dos contratos eletrônicos. Até mesmo porque, embora não estejam assinados fisicamente, os contratos apenas serão celebrados com o aceite do consumidor, de acordo com o Enunciado 173 da III Jornada de Direito Civil, geralmente feito pela utilização de senha pessoal e intransferível, ou até mesmo pelo uso de identificação biométrica ou facial.