Muitas informações vem circulando quanto à suposta proibição de demissões sem justa causa em virtude de decisão do STF a esse respeito, quando, na verdade, a discussão envolve matéria diversa.
Toda a confusão deriva da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1651, a qual versa sobre possível inconstitucionalidade do Decreto nº 2.100/96 que tornou pública a denúncia, pelo Brasil, da Convenção da OIT nº 158 relativa ao Término da Relação de Trabalho por Iniciativa do Empregador e, consequentemente, impediu que as suas disposições produzam qualquer espécie de efeito em nosso ordenamento jurídico brasileiro.
A referida Convenção Internacional prevê, dentre outros assuntos, que o término das relações de trabalho deverá ocorrer com amparo em causa justificada, relacionada ao Empregado ou Empregador, nos termos de seu Art. 4º:
“Art. 4 — Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a
menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua
capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de
funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço.”
Percebe-se, então, o motivo das interpretações equivocadas, ao passo que os termos “causas justificadas” e “justa causa” são bastante similares, apesar de possuírem conceitos totalmente diferentes.
As causas justificadas, de acordo com a Convenção em questão, podem ser interpretadas como as motivações pelas quais o funcionário será desligado, as quais podem, ou não, possuir relação direta ou indireta com o seu desempenho profissional.
Por sua vez, a justa causa pode ser compreendida como uma penalidade aplicada ao funcionário em decorrência do cometimento de ato previsto em lei que “conduz à extinção do contrato sob ônus do trabalhador” 1 .
Exemplificando, a mera insatisfação com o desempenho de determinado funcionário resulta em uma causa justificada, enquanto a observância de desídia 2 no desempenho das funções é motivo, dadas as circunstâncias de cada caso concreto, para a demissão motivada.
Resta claro, portanto, que a Convenção não proíbe as atuais demissões sem justa causa, ao apenas determinar que o funcionário seja informado dos motivos pelos quais está sendo desligado.
Contudo, alerta-se para o fato de que a Convenção garante aos funcionários demitidos, na atual conjectura imotivada, por mau comportamento ou desempenho (i) prévia oportunidade de defesa e (ii) recorribilidade do ato demissional em seus respectivos Arts. 7º e 8º.
De toda forma, a aplicabilidade das disposições contidas na Convenção de nº 158 depende do julgamento, e trânsito em julgado, da ADI nº 1625, a qual encontra-se com pedido de vista para voto do Ministro Gilmar Mendes.
Atualmente, a votação encontra-se em cinco votos a favor da procedência da ação contra três votos pela sua improcedência, tendo a maioria dos Ministros, até o momento, adotado a tese de inconstitucionalidade do Decreto nº 2.100/96 ao entenderem que a competência material seria do Congresso Nacional e não do Presidente da República.
Sendo assim, a tendência é de que a ADI seja julgada de maneira procedente e que a Convenção de nº 158 da OIT, novamente, passe a produzir efeitos em nosso ordenamento jurídico, sendo necessário posterior decisão do Congresso Nacional quanto à sua inaplicabilidade.
Todavia, acredita-se que o julgamento definitivo da matéria não deve acontecer em caráter próximo, haja vista que as deliberações se arrastam desde o ano de 1997, e que os efeitos de eventual decisão favorável devem ser modulados, provavelmente, na modalidade ex nunc, em respeito à segurança jurídica.
Logo, espera-se que, na hipótese de uma nova entrada em vigor das disposições contidas na supramencionada Convenção, seus efeitos apenas sejam de observância obrigatória a partir da decisão final do processo ou de prazo a ser estipulado pelos Ministros para a devida adequação de todos os setores afetados.
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1 DELGADO, Maurício Godinho. “Curso de Direito do Trabalho”. 16. ed. rev. e ampl. – São Paulo: LTr,
2017.
2 Trata-se de tipo jurídico que remete à ideia de trabalhador negligente, relapso, culposamente improdutivo.