O legislador infraconstitucional nem sempre atentou para as peculiaridades que envolvem o atuar da agroindústria, um contribuinte híbrido que traduz a vocação de toda a República.
Muitas discussões envolvem o atuar dessas empresas, e a última envolve a sistemática adotada de apuração não-cumulativa da PIS e da COFINS. Com efeito, as agroindústrias passaram a encabeçar autuações da Receita Federal, a partir da novel interpretação do que seria INSUMO.
Sendo mais claro, vinha entendendo a Receita Federal que o conceito de insumo, no âmbito das agroindústrias, pode ser aplicado apenas para com os bens e serviços efetivamente consumidos ou desgastados durante a fabricação do produto final. Assim, autuações com glosas estavam a atingir o que denominamos “fase agrícola”.
Tal linha de raciocínio, evidentemente restritiva, tomou por empréstimo a definição de insumos na fabricação de produtos, já existente e aplicável ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Ocorre que, para com o IPI, somente os insumos efetivamente consumidos ou desgastados em razão do contato direto com o produto em fabricação conferem crédito do referido imposto, o que já foi objeto de ampla discussão no âmbito do Poder Judiciário.
No âmbito das agroindústrias, e no que diz respeito à apuração do PIS e da COFINS, temos uma etapa agrícola de onde se extrai a matéria prima, fase importante, indissociável e antecedente, da fase industrial. Para a Receita Federal, extirpados deveriam ser todos os créditos atrelados ao que foi utilizado na fase de cultivo, colheita e transporte da matéria bruta.
O atuar da Receita Federal neste particular já não vinha encontrando respaldo doutrinário e jurisprudencial. A doutrina, e diversas decisões administrativas e judiciais, seguem na direção diversa, admitindo que o conceito de insumo, no âmbito da PIS e da COFINS, deve ser aquele atrelado ao conceito da despesa necessária, tal como previsto na legislação do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ), que define como dedutíveis para fins deste imposto todos os custos necessários ao aperfeiçoamento da atividade empresarial.
Assim, por maioria, a 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) definiu o conceito de insumo para fins de crédito de PIS e COFINS. O colegiado se alinhou ao Superior Tribunal de Justiça e entendeu que todos os bens e serviços essenciais na atividade da empresa, em qualquer fase da produção, são insumos.
Em seguida, foi publicado o Parecer Normativo Cosit 5, consignando que deve ser considerado “essencial”, nos termos da decisão do STJ, tudo aquilo do qual o processo produtivo dependa “intrínseca e fundamentalmente”. E deve ser considerado “relevante” tudo o que for necessário, mas não indispensável, ao processo produtivo.
De fato, por ausência de previsão legal, não se poderia adotar a interpretação de que o conceito de insumos para fins de PIS e de COFINS seria o conceito utilizado pela legislação do IPI, pelo motivo, evidente, de coexistirem na unidade da grande maioria das agroindústrias, duas fases distintas, interdependentes, indispensáveis, a agrícola e industrial, afastando o conceito delineado pela legislação do IPI e adotado pelos Fiscais.
Independente destas decisões, a Receita Federal agora insiste em impedir a apropriação destes valores de um exercício para o outro, glosando as rubricas (típicas do setor) “tratos culturais” e “exaustão”.
No caso de autuação por este motivo, cabe o manejo de impugnação, e até de medida judicial, porquanto o conceito de lucro real compreende o lucro líquido do período de apuração ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas, e o §3º, do citado Artigo 247, autoriza que os valores controlados no Livro de Apuração do Lucro Real – LALUR, existentes em 31 de dezembro de 1995, somente serão atualizados monetariamente até essa data, observada a legislação então vigente, ainda que venham a ser adicionados, excluídos ou compensados em períodos de apuração posteriores.